O Relatório Especial Redesenhando o Mapa Energia-Clima pressiona o setor energético a mudar
“O mundo não está a encaminhar-se para alcançar o objetivo acordado pelos governos de limitar a elevação da temperatura média mundial em longo prazo em 2 graus Celsius (º C)”. É assim que se abre o resumo executivo do Relatório Especial Redesenhando o Mapa da Energia-Clima que a Agência Internacional de Energia (IEA) apresentou esta semana. Isso ocorre porque, apesar do compromisso coletivo adquirido globalmente pelos governos, não está previsto assinar nenhum acordo internacional antes de 2015. Se levamos em consideração que as obrigações jurídicas que se gerem a partir destes possíveis acordos não entrarão em vigor até 2020, encontramo-nos justamente na situação que acarretou na decisão da IEA de chamar a atenção de todos os países do mundo com o conteúdo deste relatório.
A diretora executiva da IEA, Maria van der Hoeven, a apresentar o relatório.
O setor da energia constitui a maior fonte de emissões de gases de efeito de estufa, os gases causantes da mudança climática. Por esta razão, o relatório, de 132 páginas, está focado fundamentalmente neste setor.
Dos quatro pontos que o texto aborda, a Inmesol escolheu três (já que no quarto são indicadas as ações adicionais que ajudariam a reduzir as emissões a partir de 2020) para comentar resumidamente a seguir: [1]
1. Descrição da situação atual e do cenário climático e de política energética no mundo
- As emissões mundiais de gases de efeito estufa estão a aumentar rapidamente. No mês de maio de 2013, os níveis de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera superaram pela primeira vez em várias centenas de milhares de anos as 400 partes por milhão.
- Os acontecimentos climáticos extremos (ondas de calor, inundações, etc.), segundo a informação dada pela maioria dos especialistas, irão aumentar progressivamente, tanto em frequência como em intensidade.
- Também aumentará a temperatura global e o nível do mar.
- Embora a ação em escala mundial ainda não seja suficiente para limitar a elevação da temperatura global em 2 °C, este objetivo continua a ser tecnicamente factível, apesar de ser, ao mesmo tempo, extremamente exigente.
- Se o que se quer é cumprir com a possibilidade realista de não superar o acréscimo de 2º C, é preciso agir intensamente antes de 2020.
- O setor energético produz aproximadamente dois terços das emissões de gases de efeito de estufa, já que mais de 80 % do consumo mundial de energia está baseado em combustíveis fósseis.
- Apesar da positiva evolução de alguns países, as emissões mundiais de CO2 derivadas da energia cresceram 1,4% e alcançaram 31,6 gigatoneladas (Gt) em 2012, um máximo histórico.
- No ano 2000, os países que não pertencem OCDE geraram 45% das emissões mundiais e atualmente estes países são responsáveis por 60% das mesmas.
- Em 2012, a China foi o país que mais contribuiu para o aumento das emissões mundiais de CO2, apesar de que o aumento das emissões neste país tenha sido um dos mais reduzidos da última década. Isso se deve, em grande parte, ao crescimento das energias renováveis e de uma significativa melhoria na intensidade energética de sua economia.
- Nos Estados Unidos, a maior utilização de gás, a substituir o carvão na geração de eletricidade, contribuiu à redução das emissões em 200 milhões de toneladas (Mt), a voltar ao nível de meados dos anos noventa. Apesar das reconfortantes tendências observadas na China e nos Estados Unidos elas podem perfeitamente inverter-se.
- Na Europa, apesar do aumento do uso do carvão, ocorreu uma redução nas emissões de 50 Mt como resultado da desaceleração económica, do crescimento das energias renováveis e da existência de limites máximos de emissões para o setor industrial e energético.
- No Japão, as emissões aumentaram aproximadamente 70 Mt, pois apesar do esforço em melhorar a eficiência energética, este não foi suficiente para compensar o maior uso de combustíveis fósseis utilizados para substituir a redução da energia nuclear.
- Mesmo contando que as políticas previstas que ainda não estão em vigor serão aplicadas, a previsão para 2020 é de que as emissões mundiais de gases de efeito de estufa relacionadas com a energia superarão em 4 Gt CO2 equivalente (CO2e) o nível que permitiria alcançar o objetivo dos 2 °C, a colocar em destaque quão notável é o desafio que deve ser enfrentado na presente década.
2. Expõe quatro medidas muito específicas que, no meio tempo, o setor da energia poderia aplicar rapidamente sem um custo económico líquido para manter o objetivo dos 2 º C
As quatro políticas energéticas que propõe a IEA evitariam 3,1 Gt CO2e de emissões de gases de efeito de estufa para 2020, isto é, se reduziria em 80% as emissões necessárias para alcançar o objetivo dos 2°C. Este facto ajudaria a ganhar um tempo valioso enquanto as negociações internacionais sobre o clima estão em andamento antes da reunião da Conferência das Partes em Paris (2015) e até a implantação das políticas nacionais necessárias para colocar na prática o esperado acordo internacional.
As quatro medidas estão baseadas em tecnologias que já existem, foram provadas como eficazes em alguns países e o seu uso conjunto não prejudicaria o crescimento económico de nenhum país:
Usar medidas concretas em termos de eficiência energética (49% da redução de emissões).
Limitar a construção e o uso das centrais de carvão menos eficientes (21%).
Minimizar as emissões de metano (CH4) derivadas da produção de petróleo e gás natural (18%).
Acelerar a eliminação progressiva (mesmo que seja parcial) das subvenções ao consumo de combustíveis fósseis (12%).
- As medidas relacionadas à eficiência energética incluem a aplicação de normas de rendimento energético, tanto para edifícios (iluminação, novos aparelhos elétricos e novos sistemas de aquecimento e refrigeração) como para a indústria (motores industriais) e o transporte (veículos em circulação). Os países que já aplicam estas políticas deverão reforçá-las ou aumentá-las; os demais, deverão introduzi-las.
- Estas políticas poderiam recortar 1,5 Gt das emissões mundiais derivadas da energia para 2020, um nível parecido ao atual de Rússia.
- O investimento adicional requerido a escala mundial alcançará 200.000 milhões de dólares (USD) para 2020, mas será francamente compensado pela redução do gasto em combustível.
- Assegurar que não se construam novas centrais subcríticas de carvão e limitar o uso das menos eficientes já existentes evitaria 640 Mt de emissões para 2020 e contribuiria igualmente a reduzir a contaminação local do ar.
- As subvenções aos combustíveis fósseis somaram 523.000 milhões de dólares em 2011, o que equivale aproximadamente a seis vezes o nível de apoio às energias renováveis.
- A aceleração da eliminação progressiva parcial das subvenções para os combustíveis fósseis evitaria aproximadamente 360 Mt de emissões de CO2 em 2020 e possibilitaria a aplicação de medidas de eficiência energética.
3. Demonstra que o setor da energia precisa reagir perante a mudança climática para seu próprio interesse
Os acontecimentos climáticos extremos colocam em risco as centrais e redes de energia, as instalações de petróleo e gás, os parques eólicos e outras infraestruturas. Do mesmo modo, existem efeitos da mudança climática que são mais graduais que também dizem respeito ao setor energético: a elevação do nível do mar nas infraestruturas costeiras, a escassez de água nas centrais elétricas, as mudanças na demanda de aquecimento ou refrigeração, etc.
Demorar em reagir perante as mudanças climáticas até 2020 teria um custo. Embora por um lado evitaria o investimento de 1,5 biliões de dólares (USD) em tecnologias de baixas emissões de CO2 antes de 2020, por outro, seria preciso a partir desta data investir 5 biliões de dólares (USD) adicionais para voltar à senda desejada.
Países membros da AIE:
Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Coreia, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Japão, Luxemburgo, Noruega, Nova Zelândia, Países Baixos, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, República Eslovaca, Suécia, Suíça e Turquia. A Comissão Europeia também participa no trabalho da AIE.
Resumo completo do relatório (em espanhol):
[1] O artigo é um resumo traduzido da publicação da Agência Internacional de Energia, a ser literalmente fiel ao texto original para não distorcer seu conteúdo.